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Expulsão de condômino por prática antissocial não tem amparo na lei

Recente decisão proferida pela Justiça Estadual de São Paulo (Processo 1007991-98.2023.8.26.0100) tem suscitado a discussão dos limites do direito de propriedade e a prática de atos antissociais em condomínio, à luz do Código Civil.


Com efeito, a aposentada Elisabeth Morrone, responsável por ataques racistas contra o seu vizinho, o humorista Eddy Júnior, em outubro de 2022, foi condenada a deixar seu apartamento no edifício de forma definitiva no prazo de 90 dias, sob pena de adoção de medidas coercitivas.


No caso concreto, a discussão jurídica envolve, de um lado, os atributos do direito de propriedade e, de outro, as sanções legais para a prática de comportamento antissocial em condomínio.


O Código Civil estabelece, em seus artigos 1.228 e 1.337, que o proprietário tem os atributos de usar, gozar e dispor da coisa, e que o condômino que, por seu reiterado comportamento antissocial, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos, poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, por deliberação de três quartos dos condôminos.


Limites


Antes da decisão da assembleia condominial, há necessidade de que se assegurem ao condômino o contraditório e a ampla defesa que se aplicam também em relações jurídicas de direito privado, de sorte que a sanção pecuniária prevista no artigo 1.337 do Código Civil não pode ser aplicada sem que se garanta direito de defesa ao condômino nocivo (REsp 1.365.279, relator ministro Luis Felipe Salomão).


Condômino antissocial é aquele que possui reiterados comportamentos que afetam a estabilidade e segurança das relações entre os condôminos, inviabilizando a convivência social, de sorte que um mero ato isolado não tem o condão de configurar conduta antissocial.


Desde o século passado, o direito de propriedade não tem mais conotação absoluta, havendo limites para o seu exercício condicionado à utilização econômica e aos fins sociais.


À luz da teoria do abuso do direito, entende-se que é vedada pelo proprietário a prática de atos que não tragam qualquer comodidade ou utilidade, e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem.


Por se tratar a propriedade de um direito fundamental, entende-se que se trata de norma jurídica ligada à ideia de dignidade da pessoa humana e de limitação do poder estatal, devendo a sua exegese respeitar o seu núcleo essencial.


Há discussão doutrinária e jurisprudencial quanto à possibilidade de exclusão do condômino antissocial, eis que o Código Civil, em seu artigo 1.337, não prevê expressamente tal sanção.


Precedentes e o direito de propriedade


A propósito, o enunciado 508 da 5ª Jornada de Direito Civil prevê que, verificando-se que a sanção pecuniária mostra-se ineficaz, a garantia fundamental da função social da propriedade e a vedação do abuso do direito justificam a exclusão do condômino antissocial, desde que a ulterior assembleia delibere a propositura de ação judicial com esse fim, asseguradas todas as garantias inerentes ao devido processo legal.


Há, neste contexto, diversos precedentes jurisprudenciais, segundo os quais, em casos extremos em que as sanções pecuniárias não tenham surtido efeito, entende-se possível ao Poder Judiciário impor outras restrições ao condômino, inclusive a proibição de ingressar no imóvel.


Entretanto, a supressão do direito de usar a coisa atinge inequivocamente o núcleo essencial do direito de propriedade, que é um direito fundamental, não podendo ser imposta pelo Poder Judiciário, sob pena de afronta ao direito constitucional de propriedade.


Sem amparo


Assim, se é certo que a função social da propriedade visa coibir eventuais abusos de direito pelo proprietário do imóvel, entretanto, sua aplicação não pode dar azo à aplicação de sanção que não esteja prevista expressamente na legislação.


Portanto, a medida judicial de expulsão de condômino por comportamento antissocial não tem, pois, amparo constitucional nem tampouco legal, eis que o proprietário do imóvel tem a garantia constitucional de usar, fruir e livremente dispor da coisa, de modo que a reiteração de conduta antissocial do condômino dá ensejo à medida extrema prevista no artigo 1.337 do Código Civil (aplicação de multa do décuplo da taxa condominial).


Fonte: Consultor jurídico

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